Se já está difícil sobreviver com o salário no Brasil, ficará pior se o salário do trabalhador for penhorado pela justiça não é mesmo? Uma grande parcela do povo brasileiro, principalmente os mais pobres, não conseguem pagar suas dívidas extras em dia por conta dos compromissos para manter suas casas, como pagamentos de taxas de luz, água, telefone, mercado e transporte por exemplo.
Outras contas, como compra de roupas, calçados, móveis e eletrodomésticos costumam ficar em segundo plano e quando por qualquer eventualidade, como desemprego ou doença, essas despesas são deixadas “congeladas” para pagamento ou negociações futuras.
Se já estava difícil honrar com os compromisso, a situação poderá ser desastrosa.”Ao menos a justiça deveria respeitar um mínimo para a sobrevivência do trabalhador e de seus familiares”.
Pois bem, nesse mês de abril de 2023, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu que, é possível penhorar salários dos trabalhadores independentemente do montante recebido pelo devedores para o pagamento de dívidas comuns, como as que todos os brasileiros têm com os bancos.
A penhora só pode ser determinada quando outros meios para cobrar o réu não tiverem resultado, e será preciso avaliar o impacto econômico nas finanças do credor, segundo o entendimento firmado pelo tribunal.
A decisão é da Corte Especial do STJ e foi definida na quarta-feira (19). O colegiado seguiu voto do relator, ministro João Otávio de Noronha.
O ministro afirmou em seu voto que a impenhorabilidade do salário deve seguir como regra, mas cada caso de cobrança de dívidas deve ser analisado individualmente, para assegurar o pagamento do débito e também a dignidade do devedor.
O caso julgado envolve um credor que tem uma dívida de R$ 110 mil e recebe salário de R$ 8,5 mil.
Na primeira vez que a questão foi analisada pelo STJ, a Quarta Turma negou a penhora de 30% dos ganhos do devedor, por entender que deveria ser seguida lei que impede a penhora para saldar dívidas de quem ganha até 50 salários mínimos.
Entenda
Corte Especial admite relativizar impenhorabilidade do salário para pagamento de dívida não alimentar
STJ, Brasília 2023 | Em julgamento de embargos de divergência, a Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça (STJ) estabeleceu que, em caráter excepcional, é possível relativizar a regra da impenhorabilidade das verbas de natureza salarial para pagamento de dívida não alimentar, independentemente do montante recebido pelo devedor, desde que preservado valor que assegure subsistência digna para ele e sua família.
O colegiado acompanhou o relator, ministro João Otávio de Noronha, para quem essa relativização somente deve ser aplicada “quando restarem inviabilizados outros meios executórios que garantam a efetividade da execução”, e desde que “avaliado concretamente o impacto da constrição sobre os rendimentos do executado”.
Condições para afastar a impenhorabilidade dos salários
Os embargos de divergência foram interpostos por um credor contra acórdão da Quarta Turma que indeferiu o pedido de penhora de 30% do salário do executado – em torno de R$ 8.500. A dívida objeto da execução tem origem em cheques de aproximadamente R$ 110 mil.
A Quarta Turma entendeu que a jurisprudência do STJ se firmou no sentido de que a regra geral da impenhorabilidade das verbas de natureza salarial comporta exceção nas seguintes hipóteses: a) para o pagamento de prestação alimentícia de qualquer origem, independentemente do valor da remuneração recebida; e b) para o pagamento de qualquer outra dívida não alimentar, quando os valores recebidos pelo executado forem superiores a 50 salários mínimos mensais, ressalvando-se eventuais particularidades do caso concreto. Em ambas as situações, deve ser preservado percentual capaz de assegurar a dignidade do devedor e de sua família.
Contudo, o credor apontou precedentes da Corte Especial e da Terceira Turma que condicionaram o afastamento do caráter absoluto da impenhorabilidade das verbas de natureza salarial apenas ao fato de a medida constritiva não comprometer a subsistência digna do devedor e de sua família, independentemente da natureza da dívida ou dos rendimentos do executado.
Segundo o ministro João Otávio de Noronha, a divergência estava em definir se a impenhorabilidade, na hipótese de dívida de natureza não alimentar, estaria condicionada apenas à garantia do mínimo necessário para a subsistência digna do devedor e de sua família ou se, além disso, deveria ser observado o limite mínimo de 50 salários mínimos recebidos pelo devedor.
É possível a relativização da regra da impenhorabilidade do artigo 833 do CPC
Para o relator, o Código de Processo Civil (CPC), ao suprimir a palavra “absolutamente” no caput do artigo 833, passou a tratar a impenhorabilidade como relativa, “permitindo que seja atenuada à luz de um julgamento principiológico, em que o julgador, ponderando os princípios da menor onerosidade para o devedor e da efetividade da execução para o credor, conceda a tutela jurisdicional mais adequada a cada caso, em contraponto a uma aplicação rígida, linear e inflexível do conceito de impenhorabilidade”.
O ministro afirmou que esse juízo de ponderação deve ser feito à luz da dignidade da pessoa humana, que resguarda tanto o devedor quanto o credor, e mediante o emprego dos critérios de razoabilidade e da proporcionalidade.
“A fixação desse limite de 50 salários mínimos merece críticas, na medida em que se mostra muito destoante da realidade brasileira, tornando o dispositivo praticamente inócuo, além de não traduzir o verdadeiro escopo da impenhorabilidade, que é a manutenção de uma reserva digna para o sustento do devedor e de sua família”, disse.
Dessa forma, o relator entendeu que é possível a relativização do parágrafo 2º do artigo 833 do CPC, de modo a se autorizar a penhora de verba salarial inferior a 50 salários mínimos, em percentual condizente com a realidade de cada caso concreto, desde que assegurado montante que garanta a dignidade do devedor e de sua família.
Fonte: https://www.stj.jus.br
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